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 == Beatriz Alonso == == Beatriz Alonso ==
  
-Metacomunidades na ecologia referem-se a conjuntos de comunidades locais interconectadas por meio da dispersão de espécies e interações bióticas (Wilson, 1992; Holyoak & Mata, 2008). Em outras palavras, são redes de habitats que se influenciam mutuamente através do movimento de organismos entre eles, resultando em padrões complexos de distribuição e dinâmica das espécies. Para essa teoria, a escala (local ou regional) tem grande importância, uma vez que está intrinsecamente relacionada com o processo de dispersão (Leibold, 2009). De acordo com (Vellend2016), a dispersão é o movimento de organismos de um local para outro envolvendo diversas localidades, sendo fatores importantes para a dinâmica e estrutura das comunidades. Esses sistemas permitem entender como diferentes ambientes estão ligados e como as interações entre as espécies podem variar ao longo desses ambientes, desempenhando um papel crucial na manutenção da biodiversidade e na resposta dos ecossistemas às mudanças ambientais (Logue et al., 2011).+Metacomunidades na ecologia referem-se a conjuntos de comunidades locais interconectadas por meio da dispersão de espécies e interações bióticas (Wilson, 1992; Holyoak & Mata, 2008). Em outras palavras, são redes de habitats que se influenciam mutuamente através do movimento de organismos entre eles, resultando em padrões complexos de distribuição e dinâmica das espécies. Para essa teoria, a escala (local ou regional) tem grande importância, uma vez que está intrinsecamente relacionada com o processo de dispersão (Leibold, 2009). De acordo com Vellend (2016), a dispersão é o movimento de organismos de um local para outro envolvendo diversas localidades, sendo fatores importantes para a dinâmica e estrutura das comunidades. Esses sistemas permitem entender como diferentes ambientes estão ligados e como as interações entre as espécies podem variar ao longo desses ambientes, desempenhando um papel crucial na manutenção da biodiversidade e na resposta dos ecossistemas às mudanças ambientais (Logue et al., 2011).
  
 Baseada na teoria de Biodiversidade de Ilhas de MacArthur e Wilson (1697), a qual tenta explicar a relação espécie-área, propondo que a riqueza de uma ilha é produto dos processos de colonização e extinção, resultando no ganho e/ou perda de espécies de acordo com o isolamento dessa ilha  (MacArthur & Wilson, 1967), a teoria de metacomunidades surgiu a partir da necessidade de se explicar a dispersão em escalas locais com fluxo contínuo de espécies (Leibold et al., 2004) e conta com quatro paradigmas: seleção de espécies (do inglês “//species sorting//”), efeito de massa (do inglês, “//mass effect//”), dinâmica neutra (do inglês, “//neutral model//”) e dinâmica de manchas (do inglês, “//patch dynamics//”) (Leibold, 2009; Leibold et al., 2004; Logue et al., 2011), cada um unindo a dispersão aos processos de deriva, especiação e seleção. Baseada na teoria de Biodiversidade de Ilhas de MacArthur e Wilson (1697), a qual tenta explicar a relação espécie-área, propondo que a riqueza de uma ilha é produto dos processos de colonização e extinção, resultando no ganho e/ou perda de espécies de acordo com o isolamento dessa ilha  (MacArthur & Wilson, 1967), a teoria de metacomunidades surgiu a partir da necessidade de se explicar a dispersão em escalas locais com fluxo contínuo de espécies (Leibold et al., 2004) e conta com quatro paradigmas: seleção de espécies (do inglês “//species sorting//”), efeito de massa (do inglês, “//mass effect//”), dinâmica neutra (do inglês, “//neutral model//”) e dinâmica de manchas (do inglês, “//patch dynamics//”) (Leibold, 2009; Leibold et al., 2004; Logue et al., 2011), cada um unindo a dispersão aos processos de deriva, especiação e seleção.
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 Wilson, D. S. (1992). Complex Interactions in Metacommunities, with Implications for Biodiversity and Higher Levels of Selection (Vol. 73, Número 6). Wilson, D. S. (1992). Complex Interactions in Metacommunities, with Implications for Biodiversity and Higher Levels of Selection (Vol. 73, Número 6).
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 +====Efeitos não letais da predação, modulação comportamental====
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 +==Ana Maria de Carvalho Ferreira==
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 +Comunidades ecológicas são organizadas, em termos simples, por espécies que co-ocorrem em um espaço e tempo, e suas abundâncias relativas, que sofrem flutuações de acordo com a dinâmica populacional de cada espécie, que é balanço de natalidade, mortalidade e migrações. Dentre os fenômenos que regulam a mortalidade está a interação interespecífica de predação, que possui efeito imediato de redução do número de indivíduos de uma população de presas. No entanto, a predação pode atuar na estruturação de comunidades para além da mortalidade direta (HOLT, 2009). Devido à complexidade das teias alimentares, a predação de uma espécie pode desencadear respostas em outras, as quais estão interligadas indiretamente (WERNER, 2003). Por exemplo, a preferência alimentar do predador pode causar o aumento da diversidade quando a presa preferida é a melhor competidora, reduzindo assim sua densidade e favorecendo a coexistência de espécies de nichos similares (LUBCHENCO, 1978). Entretanto, a predação pode causar modificações indiretas ainda mais profundas. Na presença de predadores, alguns indivíduos são capazes de alterar seu fenótipo, devido a plasticidade, a fim de evitar serem predados. Tais modificações podem ser de desenvolvimento, de história de vida, morfológicas, fisiológicas e comportamentais. A esses efeitos damos o nome de interações indiretas mediadas por atributo (trait-mediated indirect interactions), ou interações comportamentais indiretas (behavioral indirect interactions), ou modificações de interação (interaction modifications) (WERNER, 2003). Em outras palavras, a presença de um predador é capaz de alterar atributos na presa, que lhe permitem melhor evitação da predação, consequentemente modificando o efeito desta sobre a mortalidade da população, uma vez que predar torna-se mais difícil.  
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 +A maioria dos estudos de predador-presa foca no efeito letal do consumo da presa na densidade populacional, entretanto a influência do predador no fenótipo dos sobreviventes e em seus padrões comportamentais, efeitos não letais, podem ser tão significantes para a densidade quanto o consumo (WERNER, 2003). Experimentos realizados com ninfas de libélulas Tramea lacerata e Erythemis simplicicollis, e sua presa compartilhada, ninfas de donzelinha (Zygoptera), demonstraram que menos da metade das presas foram consumidas por E. simplicicollis, quando na presença de T. lacerata, que é predadora de E. simplicicollis, ainda que parte das ninfas de T. lacerata estivessem experimentalmente incapacitadas de predar (WISSINGER & MCGRADY, 1993). A redução populacional de E. simplicicollis devido a predação por T. lacerata explica apenas parcialmente a diminuição do consumo de presas pela primeira. A redução da mortalidade das presas deve-se também a mudanças comportamentais de Erytremis simplicicollis na presença do predador. Nesse caso, é provável que o efeito de interferência de uma espécie em outra seja resultado de uma demanda conflitante entre o forrageio e evitar a predação. Dessa forma, ao evitar ser predada por Tramea lacerata, Erytremis simplicicollis reduz sua taxa de forrageio e sua capacidade competitiva em relação a presa compartilhada (WISSINGER & MCGRADY, 1993).
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 +Há casos em que as mudanças comportamentais são acompanhadas por alterações morfológicas. Anfíbios possuem uma grande diversidade de respostas induzidas por predadores devido a sua plasticidade fenotípica. Em estudo realizado com seis espécies de anuros e seus respectivos predadores, Relyea (2001) observou que, assim como para outros taxa, uma das respostas comportamentais exibidas é a diminuição da atividade na presença de predadores, além da evitação espacial. Todas as espécies de girinos apresentaram também alterações morfológicas em suas caudas quando na presença de pelo menos um de seus predadores. Enquanto comportamentos menos ousados garantem a segurança, apresentam demanda conflitante ao diminuírem a taxa de forrageio. Em contraponto as alterações na cauda possibilitam melhor desempenho no nado e fuga, contribuindo também para melhor forrageio e aproveitamento para o desenvolvimento, em detrimento de maior investimento energético (RELYEA, 2001).
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 +Mudanças comportamentais e morfológicas predador-específicas parecem ser difundidas entre os taxa (animais e plantas), e distintas entre as espécies para um mesmo predador. A capacidade de distinguir entre predadores, e ajustar sua resposta à ameaça em potencial, é uma habilidade importante para que não haja investimento desnecessário em estratégias anti-predação, ou baixo investimento que cause risco de predação. Atributos comportamentais são mais plásticos que atributos morfológicos, logo mais fáceis de serem observados sob variações ambientais (RELYEA, 2001). Possíveis respostas comportamentais induzidas por predação são a redução ou aumento de atividade/movimentação, mudança de habitat, e busca por refúgios (WERNER, 2003).
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 +A modulação comportamental pode ser observada a partir de diversos parâmetros e sempre está associada à tomada de decisão por um indivíduo frente a um estímulo. Durante minha graduação em Ciências Biológicas me dediquei a estudar experimentalmente as respostas comportamentais de formigas poneromorfas frente a coespecíficas não companheiras de ninho. Tendo como variável moduladora o gradiente de urbanização em três níveis (urbano, intermediário e natural), observamos como díades de formigas de ambientes de gradientes diferentes adaptam seu comportamento. Nossas previsões de que os comportamentos apresentados por formigas de ambientes diferentes seriam distintos foram corroboradas por nossos resultados (FERREIRA et al., dados não publicados). Durante as análises, hipóteses sobre padrões observados como atenuação do comportamento agonístico em ambiente urbano, me motivaram a seguir investigando possíveis impactos da urbanização no comportamento de formigas, como o aumento da atividade de forrageio, somado a diminuição da agressividade, reportado para colônias urbanas da formiga Temnothorax nylanderi (JACQUIER et al., 2023).
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 +A atenuação do comportamento agonístico em grupos que apresentam aumento da atividade pode ser explicada pelo número maior de encontros intraespecíficos durante o forrageamento, que permite familiarização das colônias (SANADA-MORIMURA et. al, 2003). Entretanto, qual seria o fator motivador para o aumento de forrageio? Alguns vertebrados (aves e mamíferos) apresentam personalidades mais ousadas em ambientes urbanos, o que lhes permite melhor exploração de recursos. Nas cidades, populações sinantrópicas são expostas a diferentes fatores ambientais e estressores em relação a seus habitats naturais, e são submetidos a alterações alimentares (origem artificial), recursos espacialmente centrados e mudanças da comunidade de predadores (SOL et al., 2013). As leituras referentes aos efeitos não letais da predação me levaram a refletir se, em ambientes urbanos, a ausência de predadores naturais de formigas estaria possibilitando maior atividade de forrageamento, uma vez que o risco de predação seria menor. Tal possibilidade acrescenta fatores que não havia pensado em estudar a princípio. Meus objetivos iniciais buscavam responder se o aumento da atividade de forrageio é observado para meu modelo e, se esse aumento tem influência na prestação de serviços ecossistêmicos (dispersão de sementes), considerando variáveis ambientais, vegetação e recursos alimentares, sem, no entanto, considerar os efeitos causados pela ausência ou presença de uma comunidade de predadores.
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 +Em conclusão, estudar os efeitos indiretos da predação é importante para compreender como as interações entre espécies atuam na estruturação da comunidade. Os efeitos diretos da predação explicam parcialmente o observado nas densidades populacionais, as alterações comportamentais também devem ser consideradas para entender as dinâmicas presentes na comunidade.
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 +==Referências Bibliográficas==
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 +FERREIRA, A. M. C. et al. Efeito da urbanização sobre interações intraespecíficas: Repertório comportamental da formiga Pachycondyla striata. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Ciências Biológicas) – Instituto de Biociências, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2023.
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 +HOLT, R.D. Predation and community organization. Cap. III.3, The Princeton Guide to Ecology.
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 +JACQUIER, L.; MOLET, M.; DOUMS, C. Urban colonies are less aggressive but forage more than their forest counterparts in the ant Temnothorax nylanderi. Animal Behaviour, v. 199, p. 11-21, 2023.
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 +LUBCHENCO, J. (1978). Plant species diversity in a marine intertidal community: importance of herbivore food preference and algal competitive abilities. American Naturalist, 23-39.
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 +RELYEA, R.A., 2001. Morphological and behavioral plasticity of larval anurans in response to different predators. Ecology, 82(2), pp.523-540.
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 +SANADA-MORIMURA, S. et al. Encounter-induced hostility to neighbors in the ant Pristomyrmex pungens. Behavioral Ecology, v. 14, n. 5, p. 713-718, 2003.
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 +SOL, D.; LAPIEDRA, O. l; GONZÁLEZ-LAGOS, C.. Behavioural adjustments for a life in the city. Animal behaviour, v. 85, n. 5, p. 1101-1112, 2013.
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 +WERNER, E.E. and PEACOR, S.D., 2003. A review of trait-mediated indirect interactions in ecological communities. Ecology, 84(5), pp.1083-1100.
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 +WISSINGER, S., & MCGRADY, J. (1993). Intraguild Predation and Competition Between Larval Dragonflies: Direct and Indirect Effects on Shared Prey. Ecology, 74(1), 207–218. doi:10.2307/1939515
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ensaios/2024/start.1710861938.txt.gz · Última modificação: 2024/03/19 15:25 por giovanni
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