O papel da macrófita aquática Echinochloa polystachya (H.B.K.) Hitchcock na caracterização física e química da água na zona de desembocadura do Rio Paranapanema na Represa de Jurumirim – SP
Em regiões tropicais, as macrófitas aquáticas presentes na zona de desembocadura dos rios nos reservatórios apresentam grande biomassa, contribuindo sobremaneira para a produção de matéria orgânica para o ecossistema aquático. Podem apresentar importante papel na transferência de nutrientes entre a fase aquática e a terrestre (JUNK, 1980), tornando-se importantes controladoras da dinâmica de nutrientes no ecossistema (POMPÊO, 1996). Além disso, os estandes das macrófitas aquáticas também possibilitam a existência de inúmeros microhabitats, onde uma considerável gama de organismos pode passar parte ou todo seu ciclo de vida, depositando ovos, protegendo-se de predadores, alimentando-se. Assim, a água do estande de macrófitas aquáticas poderá ser um compartimento diferenciado das águas abertas, refletido por diferenças físicas, químicas e biológicas. Os experimentos efetuados por DALE & GILLESPIE (1978), sugerem que a temperatura da água sofre influências do próprio arranjo das folhas na população de macrófitas aquáticas bem como do índice de área foliar. A interceptação da energia luminosa pela superfície foliar aquece a água localmente, enquanto que na parte de baixo, devido ao sombreamento, tende a ser menor. Desta forma, segundo ESTEVES (1988), os estandes das macrófitas aquáticas constituem-se num compartimento muito complexo, que devem ser analisados separadamente da região de águas abertas.
Este trabalho pretende mostrar os padrões de modificações sazonais de variáveis físicas e químicas da água no estande de Echinochloa polystachya (H.B.K.) Hitchcock e no rio Paranapanema (SP, Brasil). Visa também verificar a influência do estande sobre essas variáveis.
A represa de Jurumirim (reservatório Engenheiro Armando Avellanal Laydner) está localizada na porção sul do Estado de São Paulo e é a primeira represa no sentido montante-jusante do complexo de barragens que se sucedem no rio Paranapanema. Na cota 570 m, a água de superfície do reservatório cobre uma área de cerca de 484 km2 e o seu volume é estimado em 7941 hm3. A bacia hidrográfica apresenta cerca de 17800 km2. É um reservatório oligotrófico, com baixa produtividade primária fitoplanctônica na zona de barragem, e o crescimento das algas parece ser limitado pelo fósforo (HENRY, 1990, 1993).
Na zona de desembocadura do rio Paranapanema no reservatório (Fig. 1a), são observadas além do canal do rio, extensas áreas inundadas, ambas margeadas por estandes de macrófitas aquáticas emergentes, dominados por E. polystachya.
A gramínea E. polystachya apresenta um colmo robusto com mais de 15 m de comprimento, que está enraizado nas margens, projetando-se em direção às águas abertas (Fig. 1b). Esta macrófita aquática apresenta elevadas biomassas (1150 a 2756 gPS/m2) e estoques de nutrientes (0,36 a 4,43 kgP/m2 e 9,6 a 46,0 kgN/m2), e tem uma produção primária estimada em 32 t/ha/ano (POMPÊO, 1996).
a)
b)
Figura 1: a) Local de estudo na zona de desembocadura do rio Paranapanema na represa de Jurumirim e b) estande de E. polystachya.
As amostras de água foram coletadas mensalmente em 3 profundidades em dois pontos fixos, um no interior do estande de E. polystachya e outro adjacente ao canal principal do rio Paranapanema, às margens do estande (Fig. 1).
Foram determinadas as temperaturas do ar e da água com um termistor Toho Dentan (± 0,1°C), o material em suspensão total (MST) (TEIXEIRA et al., 1965; TUNDISI, 1969), o oxigênio dissolvido pelo método Winkler (GOLTERMAN et al., 1978), a condutividade elétrica (condutivímetro Hach Mod. 2511, sendo os valores corrigidos para 25°C, GOLTERMAN et al., 1978) e o pH (potenciômetro Micronal B 371). Para a estimativa dos teores dos nutrientes dissolvidos, a água foi previamente filtrada em filtro Millipore AP40 e o filtrado armazenado em frascos de polietileno e estocados em freezer. Em laboratório, as determinações envolveram as análises de nitrato e nitrito (MACKERETH et al., 1978), amônio (KOROLEFF, 1976), fosfato inorgânico dissolvido (FID) e fosfato total dissolvido (FTD) (STRICKLAND & PARSONS, 1960).
A variação do nível da água foi determinada mediante leitura em régua graduada instalada no interior do estande. Foram obtidas os valores das cotas diárias do nível da água (cotas das 9h00min) e das vazões no setor operacional da barragem, as temperaturas máxima e mínima e as precipitações diárias na estação climatológica da Cooperativa Agro Industrial Holambra (Fazenda Holambra, Paranapanema, SP), localizada a cerca de 30 Km em linha reta do local de estudo.
Os dados climatológicos foram submetidos a uma análise de agrupamento através da classificação hierárquica ascendente, utilizando-se a distância Euclidiana, tendo como critério de agregação as médias das distâncias ponderadas. Os cálculos foram efetuados através do programa estatístico STAT-ITCF 4.0. Os dados foram previamente padronizados pela subtração da média e divisão pelo desvio padrão (CURI, 1983).
Possíveis diferenças entre as profundidades em cada um dos grupos experimentais (variáveis) foram detectadas através do uso da técnica de análise multivariada, complementada com a construção dos intervalos de confiança simultâneos (MORRISON, 1976).
Os valores das variáveis físicas e químicas na água do rio e do estande foram comparados entre si e também com aqueles encontrados por MOSCHINI-CARLOS (1996) em uma baia permanentemente inundada e ligada ao rio Paranapanema, próximo ao local deste estudo através do método de MORRISON (1976).
As maiores temperaturas foram observadas no período de outubro/93 a março/94 (Fig. 2). A variação anual da temperatura do ar medida no local de estudo nos dias de coleta mostra padrão semelhante à temperatura do ar medida no posto de observação climatológica (Fig. 3). A precipitação mostrou marcado padrão sazonal, com maiores valores em início de 94 e em setembro/93 (Fig. 2).
A análise de agrupamento (Fig. 4), permitiu identificar dois períodos durante o ano de estudo. O primeiro compreendeu os meses de menores temperaturas e precipitações (de agosto e setembro/93 e de abril a julho/94) e o segundo período incluiu os meses de maiores precipitações e temperaturas (de outubro/93 a março/94).
A variação anual do nível da água (cota) mostrou também uma oscilação bem marcada (Fig. 5). Entre o início de agosto e o final de setembro/93 ocorreu uma pequena diminuição do nível da água. Posteriormente, em função da elevada precipitação ocorrida em meados de setembro/93, houve uma rápida elevação, atingindo um pico máximo no início de outubro/93. Seguiu-se um gradativo abaixamento até janeiro/94 (período de menor nível da água). A partir de fevereiro/94 ocorreu uma rápida elevação, devida principalmente às intensas precipitações ocorridas em janeiro/94 e associadas com as vazões mais baixas, propiciando acúmulo de água no reservatório. A partir do final de fevereiro e início de março/94, o nível da água manteve-se relativamente estável até julho/94. Desta forma, foi observada uma amplitude de mais de 2 m na variação do nível da água. Esse padrão de variação é em grande parte devido à operação do reservatório, particularmente às alterações de vazão.
A variação do nível da água determinada no interior do estande de E. polystachya (Fig. 3), tem padrão de variação similar ao das cotas. As diferenças provavelmente devem-se à baixa freqüência de medidas efetuadas no estande.
O modelo de superfície Z=a+bX+cY+dX2+eXY+fY2, onde Z= temperatura (°C), Y= profundidade (m), X= mês e a, b, c, d, e e f constantes, aplicado aos valores de superfície, meio e fundo mostrou-se estatisticamente significativo (Fig. 6). Para ambos os locais, observa-se padrão semelhante na variação anual, com temperaturas mais elevadas entre os meses de outubro/93 e março/94, coincidente com o padrão observado para a temperatura do ar. A variação da temperatura do ar com a água do rio e ambos com a do estande, mostraram-se altamente correlacionadas (Tab. 1 e 2).
Tabela 1: Coeficientes de correlação linear (* p<0,05) entre as respectivas variáveis determinadas na água do rio e do estande.
variável
|
|
r
|
oxigênio
|
|
0,24
|
pH
|
|
-0,14
|
condutividade elétrica
|
|
0,64*
|
MST
|
|
-0,14
|
NO3-
|
|
0,16
|
NO2-
|
|
-0,08
|
NH4+
|
|
-0,04
|
FID
|
|
0,62*
|
FTD
|
|
0,43
|
temperatura
|
|
0,99*
|
Tabela 2: Coeficientes de correlação linear (* p<0,05) entre as temperaturas da água do rio e do estande e a temperatura do ar (Fazenda Holambra), valores medidos nos dias de coletas.
Figura 6: Variação anual da temperatura e da condutividade elétrica da água no rio Paranapanema e no estande de E. polystachya.
Em relação à condutividade elétrica na coluna d’água, maiores valores foram medidos nos meses de novembro/93 a março/94 (Fig. 6). O seu padrão de variação sazonal foi inverso aos observados para a precipitação e para a concentração de MST (Fig. 7a). Uma correlação significativa entre os valores de condutividade elétrica dos dois locais foi também encontrada (Tab. 1).
No rio, a concentração de MST mostrou um padrão de variação anual semelhante ao da precipitação. Maiores valores foram encontrados entre os meses de novembro/93 a março/94 (Fig. 7a). A variação da concentração de oxigênio determinada na água do estande (Fig. 7b) mostra uma tendência inversa a observada no rio (Fig. 8). Nenhuma relação significativa foi encontrada entre as concentrações de MST na água do rio e na presente na água do estande (Tab. 1).
As menores concentrações de oxigênio dissolvido na água do rio foram encontradas entre os meses de novembro/93 a março/94 e as maiores de agosto a outubro/93 e de abril a julho/94 (Fig. 7b). O padrão de variação anual apresentado pelo teor de oxigênio dissolvido foi inverso ao da temperatura da água. Não foi observado um padrão definido na variação sazonal da concentração de oxigênio dissolvido determinado na água do estande (Fig. 8). Também nenhuma correlação linear foi encontrada entre os teores de oxigênio dissolvido determinados na água do rio e no interior do estande (Tab. 1).
O pH da água apresentou pequena amplitude de variação ao longo do ano (Fig. 8). Nenhuma correlação significativa foi determinada entre as estações de coletas de água (Tab. 1).
Em ambas as estações de coletas, as concentrações de nitrito apresentaram valores baixos e nenhuma correlação foi encontrada entre elas (Fig. 9, Tab. 1).
Apesar de não ter sido verificada correlação linear entre as concentrações de nitrato e de amônia determinadas na água do rio e do estande, um padrão de variação inversa entre os valores de amônia e de nitrato foi observada (Fig. 9).
Figura 7: Variação anual da concentração de MST (a) e de oxigênio dissolvido na água do rio (b).
Figura 8: Médias mensais (superfície, meio e fundo) do pH, das concentrações de MST e de oxigênio dissolvido (E - estande; R - rio).
Figura 9: Médias mensais (superfície, meio e fundo) dos teores de nitrato, nitrito, amônia, FID e FTD na água do rio e do estande.
Os teores de fosfato, em geral, apresentam menores valores no final de 93 e início de 94, com exceção de FTD na água do rio, que apresentou um pico em fevereiro/94 (Fig. 9). As concentrações de FID determinadas no rio e no estande estão correlacionadas entre si (Tab. 1). Em relação aos teores de FTD, determinados na água dos dois locais, nenhuma correlação linear significativa foi encontrada (Tab. 1).
Tabela 3: Médias, desvios padrão, valores mínimos e máximos e coeficientes de variação (%) das variáveis analisadas no rio (R) e no estande (E) ao longo do ano de estudo. dp - desvio padrão, cv - coeficiente de variação.
Como pode ser observado na Tab. 3, o pH (E e R) foi a variável que apresentou menor amplitude de variação ao longo do ano de estudo, seguido da condutividade elétrica (E) e da concentração de oxigênio dissolvido (R). O FID e o MST apresentaram as maiores variações ao longo do ano, refletido pelos seus maiores coeficientes de variação.
A análise multivariada indica que as médias anuais das variáveis físicas e químicas determinadas em três profundidades no rio não diferem do ponto de vista estatístico (Tab. 4), sugerindo que não há gradientes verticais entre as variáveis medidas. O mesmo não foi observado para o estande (Tab. 4). A comparação revelou que houve menores teores de oxigênio dissolvido, MST e nitrato e maior temperatura na camada superficial de água do estande, quando comparado com os valores determinados nas camadas mais profundas. Para estas variáveis um padrão de estratificação foi encontrado.
Tabela 4: Valores médios das variáveis físicas e químicas ao longo do ano para superfície (S), meio (M) e fundo (F) e resultados do teste estatístico multivariado (p<0,05).
A análise multivariada também mostra que há diferenças estatisticamente significativas (p<0,05) entre os teores de oxigênio dissolvido na água do rio, do estande e da baia (Tab. 5), com valores maiores no rio e na baia. Com relação ao MST, menores concentrações são encontradas na baia, quando comparadas com aquelas do estande e do rio. A comparação das médias de temperatura da água revela que a água do rio apresenta valor menor do que aqueles no estande e na baia.
Tabela 5: Valores médios dos parâmetros físicos e químicos ao longo do ano para rio (R), baia (B) e estande (E) e resultados do teste estatístico multivariado (p<0,05). 1 - Dados obtidos de MOSCHINI-CARLOS (1996).
variável
|
Baia(1)
|
Estande
|
Rio
|
Fcal
|
Fcrit
|
conclusão
|
oxigênio (mg/l)
|
6,86
|
4,49
|
7,19
|
6,78
|
4,10
|
E¹(R=B)
|
pH
|
6,5
|
6,7
|
6,6
|
0,52
|
4,10
|
E=R=B
|
cond. elétrica (uS/cm)
|
55,12
|
58,75
|
58,55
|
1,86
|
4,10
|
E=R=B
|
MST (mg/l)
|
7,12
|
18,31
|
16,18
|
22,15
|
4,10
|
B¹(E=R)
|
NO3- (mg/l)
|
155,06
|
121,54
|
234,54
|
3,79
|
4,10
|
E=R=B
|
NO2- (mg/l)
|
1,90
|
2,44
|
2,59
|
1,34
|
4,10
|
E=R=B
|
NH4+ (mg/l)
|
14,69
|
17,48
|
17,13
|
0,49
|
4,10
|
E=R=B
|
FID (mg/l)
|
5,40
|
11,82
|
10,59
|
4,09
|
4,10
|
E=R=B
|
FTD (mg/l)
|
13,46
|
18,97
|
16,18
|
1,51
|
4,10
|
E=R=B
|
temperatura (C)
|
22,25
|
22,22
|
21,64
|
6,01
|
4,10
|
R¹(E=B)
|
De acordo com NIMER (1979), a região do Alto Paranapanema apresenta temperatura média anual quase sempre inferior a 22°C, variando de 18 a 20°C, no verão esta temperatura média é superior a 22°C. Os dados climatológicos provenientes do posto meteorológico da Fazenda Holambra e as medições feitas no local de estudo corroboram o padrão geral descrito por NIMER (1979).
A temperatura média anual da água do rio Paranapanema foi de 21,6°C, com uma amplitude de variação ao longo do ano de 14,7°C. DRAGO (1984) determinou para o rio Paraná (PR, Brasil), maiores amplitudes de variação entre superfície e fundo (17,1°C e 15,6°C, respectivamente). THOMAZ et al. (1992c) registraram amplitudes de variação ao longo do ano de 11,6 e 13,3°C, respectivamente para os rios Paraná e Ivinheima.
A variação anual da temperatura da água do rio Paraná (DRAGO, 1984; THOMAZ et al., 1992c) e do Arroyo Toledo-Carrasco (Uruguai) (AROCENA et al., 1992), apresentou padrão de variação semelhante ao do rio Paranapanema, com temperaturas máximas entre dezembro e março e mínimas entre junho e agosto. O elevado coeficiente de correlação encontrado reflete a dependência da temperatura da água em relação a temperatura do ar, como assinalou DRAGO (1984). Segundo HYNES (1970), para grandes rios e a uma considerável distância de sua cabeceira, a temperatura da água é usualmente próxima à média mensal da temperatura do ar. COLE (1979) também afirma que a temperatura da água apresenta um padrão de variação anual semelhante ao da temperatura do ar. Desta forma, como apontado por SCHÄFER (1985), a temperatura, considerada um dos principais fatores climáticos, tem papel importante nas condições hidrológicas e ecológicas de um rio.
DRAGO (1984) não observou diferenças significativas entre os perfis de temperatura da água do meio do canal e de ambas as margens do rio Paraná. Atribuiu essa homogeneidade ao processo de mistura originado pelo fluxo turbulento, que raramente propicia estratificação térmica vertical da água nos grandes rios. A despeito do rio Paranapanema ser um curso de água com dimensões menores, a mistura da massa de água deve ser também o fator responsável pela sua homogeneidade, como ficou constatada na análise multivariada.
A relação inversa entre a variação anual da concentração de oxigênio dissolvido e a temperatura, é decorrente do fato de que a solubilização do oxigênio na água é função inversa à temperatura. Desta forma, nos meses de temperaturas mais elevadas, a menor solubilização desse gás acarreta teores mais baixos na água. O aumento da temperatura também acarreta elevação nas taxas de decomposição (JUNK, 1980; THOMAZ, et al., 1992a), como conseqüência, pode ocorrer a diminuição dos teores de oxigênio no meio. As concentrações de oxigênio nos rios, segundo SCHÄFER (1985), variam em função das condições climáticas regionais e de sua localização (em altitude ou na planície). Dessa forma, a marcada variação anual do teor de oxigênio dissolvido observada, pode ser explicada também em função das características meândricas e hidrodinâmicas do rio Paranapanema, a montante do local de estudo. Apesar de acarretar mistura na massa d'água, provavelmente a turbulência não causa alterações substanciais nos teores de oxigênio dissolvido na água. Além disso, a montante do local de estudo possivelmente não há fontes pontuais (esporádicas ou sazonais) significativas de matéria orgânica, que possam propiciar uma diminuição dos teores de oxigênio na água através do consumo pela decomposição.
O aumento na concentração de MST observado no período de precipitações mais intensas, deve ser atribuído provavelmente à maior participação proporcional da fração inorgânica do material particulado transportado pelo rio. Esse material alóctone, incluindo íons, deveria propiciar aumento na condutividade elétrica. A maior entrada de água proveniente da bacia de drenagem resulta numa diminuição proporcional das concentrações de íons dissolvidos e, conseqüentemente, na condutividade elétrica, caracterizando portanto um efeito de diluição. HENRY (dados não publicados), trabalhando em Campina do Monte Alegre, a montante do local deste estudo, demonstrou através do desenvolvimento de modelo, a diminuição da condutividade elétrica com o aumento da vazão, corroborando o efeito de diluição como hipótese explicativa. THOMAZ et al. (1991) também atribuiu às menores concentrações de nutrientes observadas no rio Baía (MS, Brasil) no período de cheia à diluição decorrente da subida das águas do rio Paraná. As menores concentrações das frações de fósforo observadas na água do rio e no estande no período de maior precipitação também atestam o efeito de diluição.
Com relação ao padrão de variação alternado dos teores de nitrato e de amônia, processos relacionados à ciclagem do nitrogênio, particularmente à nitrificação, devem ser cogitados na explicação destas oscilações.
THOMAZ et al. (1992c) não observaram um padrão tão marcante na variação do nível da água do rio Paraná e Ivinheima, quando comparado com aquele do rio Paranapanema. Segundo estes autores, o controle da vazão do reservatório de Itaipu se faz sentir sobre os níveis fluviométricos do rio Paraná, especialmente durante o período de seca. Na zona de desembocadura do rio Paranapanema, o padrão sazonal observado no nível da água é decorrente principalmente da operação do reservatório, com alterações de vazão em função da demanda. Uma defasagem de cerca de um mês entre o período de maiores precipitações e a elevação da cota do reservatório foi também constatada.
Em Campina do Monte Alegre (rio Paranapanema, a montante de sua zona de desembocadura), HENRY (1992) determinou através de coletas bimensais de maio/88 a março/89, uma variação nas concentrações de nitrato de 74,2 a 137,0 mg/l; de FTD de 2,57 a 59,0 mg/l e de MST de 14,5 a 67,3 mg/l. No período de agosto/93 a julho/94, as concentrações de FTD e de MST foram semelhantes às obtidas no período de maio/88 a março/89. Em relação ao nitrato, concentrações mais altas e com maior variabilidade foram encontradas. Estas diferenças podem ser atribuídas a maior intensidade das amostragens efetuada neste estudo e a influxos das zonas marginais, como as lagoas.
Segundo HOWARD-WILLIAMS & LENTON (1975), na zona litoral de lagos com grande cobertura de plantas aquáticas, a desoxigenação da água é devida principalmente a três fatores: (a) reduzida movimentação da massa de água devida à presença da cobertura vegetal interferindo na oxigenação, (b) baixas taxas de fotossíntese fitoplanctônica na região de macrófitas aquáticas e conseqüentemente baixa produção de oxigênio, em função da menor intensidade luminosa e (c) consumo rápido do oxigênio produzido pelas plantas por organismos presentes no interior dos estandes. Além desses fatores, a temperatura mais elevada observada na superfície da água no estande reduz a solubilização desse gás e, consequentemente, a sua concentração na água. KUNII et al. (1980) observaram período de considerável diferença na concentração de oxigênio dissolvido entre a superfície e o meio com o fundo em Ojaga-ike (Japão), uma lagoa rasa e eutrófica. Segundo os autores, a maior concentração de oxigênio dissolvido observada na superfície dessa lagoa pode ser devida a sua liberação, durante a atividade fotossintética das macrófitas aquáticas, na camada superior ou ainda devido ao seu maior consumo pela decomposição que ocorre no fundo, acarretando diferenças elevadas entre superfície e o fundo. Provavelmente, os fatores assinalados anteriormente, atuando em conjunto, devem ser os responsáveis pela ausência de um marcado padrão de variação anual da concentração de oxigênio dissolvido no estande de E. polystachya. Esses fatores também devem ser os responsáveis pelo gradiente constatado no estande (Tab. 4). Os teores de oxigênio dissolvido determinados na água do rio refletem influências externas, principalmente do padrão sazonal de temperatura do ar. As concentrações determinadas na água presente no interior do estande de E. polystachya refletem processos internos, como produção e decomposição.
As diferenças significativas entre as temperaturas e as concentrações de oxigênio dissolvido encontradas na água do rio e no estande, bem como o gradiente térmico observado no estande, provavelmente sejam decorrentes da presença de E. polystachya, que atua como barreira física à passagem da água e à ação do vento. Assim, haveria menor renovação da água, com seu tempo de residência aumentado e a mistura da massa d’água pela ação do vento seria reduzida. A falta de correlação entre as variáveis físicas e químicas da água do rio e do estande (Tab. 1), também ressalta as diferenças entre as massas de água. Desta forma, a natureza física e química da massa d’água no interior do estande de E. polystachya seria decorrente principalmente de processos internos.
As diferenças observadas entre as concentrações de oxigênio dissolvido, de MST e da temperatura na água do rio, do estande e da baia (Tab. 5), também podem estar relacionadas à variação do nível da água (THOMAZ et al., 1992a, b e c; CAMARGO & ESTEVES, 1995). Como a baia estudada é rasa e em períodos de águas baixas encontra-se mais isolada do rio (MOSCHINI-CARLOS, 1996), estas características sugerem que processos intrínsecos, como a restrição à circulação da massa d’água pela ação do vento, também devem ser responsáveis pelas diferenças apontadas. Em decorrência das baixas profundidade e velocidade de corrente, além da presença de períodos com estratificação térmica, a baia estudada pode ser considerada como um ambiente intermediário entre lêntico e lótico de natureza polimítica (MOSCHINI-CARLOS, 1996).
A FAPESP (Projeto Temático: proc. 91/0612-5) pelo suporte financeiro e pela bolsa de estudos (proc. 92/2886-8) e aos Srs. HA. Rodrigues e M.F.P. de Oliveira pelo auxílio nos trabalhos de campo e de laboratório.
(1) Depto de Ecologia - USP - IB - São Paulo - SP
(2) Depto. de Zoologia e (4) Bioestatística - UNESP - IB, - Botucatu - SP
(3) UNESP, Sorocaba, SP