Ecologia Límnica - Limnologia no Brasil
Apesar de inúmeras pesquisas ocorridas nos séculos XVII, XVIII e XIX, proporcionadas principalmente por naturalistas estrangeiros, estudos com enfoque ecológico no Brasil são recentes e, mesmo crescente, ainda há reduzido número de profissionais com formação específica em ecologia. Iniciada de forma sistemática e ininterrupta no Brasil a partir de 1976, com a abertura de vários cursos de pós-graduação (Parentoni Martins & Araújo-Lima, 2001), cerca de 300 novos doutores foram formados a partir de 1976 (Barbosa, 2001) e desenvolvem pesquisas em ecologia em universidades e institutos de pesquisa em todo país. Atualmente são 40 instituições que oferecem cursos de pós-graduação recomendados e reconhecidos pela CAPES na área de ecologia.
Em análise crítica sobre o desenvolvimento da ecologia no Brasil, Parentoni Martins & Araújo-Lima (2001) apontam que os pesquisadores têm dificuldades em reconhecer a identidade intelectual da ecologia e desenhar os contornos que definem sua abrangência; afirmam também, que há o envolvimento de muitos profissionais sem formação ecológica exercendo atividades no âmbito de competência dos biólogos / ecólogos, e que os ecólogos devem adotar uma abordagem interdisciplinar na resolução dos problemas ambientais e devem ter a competência de identificar e diferenciar o papel efetivo da teoria ecológica na aplicação e construção do conhecimento interdisciplinar. Também apontam que a tradição da pesquisa em ecologia no Brasil é em ecologia de ecossistemas, talvez por isso a relativa contribuição dos pesquisadores brasileiros ao desenvolvimento teórico da ecologia, como sugerido por Parentoni Martins & Araújo-Lima (op cit).
a) rio Parnaiba, margem direita, cidade de Uruçuí - Piaui. b) represa de Jurumirim, Avaré, São Paulo.
Analisando os Anais de resumos do V Congresso de Ecologia do Brasil e do VIII Congresso Brasileiro de Limnologia, ambos ocorridos em 2001, podemos verificar que substancial parcela dos trabalhos apresentados é descritiva. Porém, diferentemente dos trabalhos desenvolvidos no período inicial de estudos nos ecossistemas aquáticos, em sua maioria não constituem uma listagem de espécies presentes no ambiente ou uma tabela de valores das variáveis ambientais estudadas. São estudos envolvendo escalas espaciais e temporais objetivando descrever a dinâmica do sistema. Portanto, são estudos elaborados, com elevado grau de complexidade e de domínio dos métodos e técnicas de campo e laboratório e análise de dados. Podemos dizer que os pesquisadores procuram tiram as melhores “fotografias” possíveis do objeto de estudo na tentativa de levantar dados para discutir sua estrutura e função. Em sua grande maioria, os estudos não abordam pesquisas de longa duração, sendo que boa parte dos trabalhos de levantamento de dados a campo normalmente estende-se por um único ciclo anual. Estudos plurianuais são restritos, destacando-se Giani & Figueiredo (1999).
Da mesma maneira que são necessários estudos em diferentes escalas espaciais e temporais, são fundamentais estudos em vários níveis de organização, ou seja, indivíduo, população, comunidade e ecossistema, para determinar de modo mais preciso aspectos relativos a cada nível organizacional. Posteriormente, pode-se avaliar as respectivas propriedades emergentes (Odum, 1986; Frontier, 2001), permitindo melhor conhecimento sobre a estrutura e função do nível organizacional correspondente. Assim, pode-se “olhar” o ecossistema sob diversos ângulos e, através de diferentes enfoques, visualizar sua extraordinária complexidade.
A análise desses mesmos Anais também revela que experimentos em escala de laboratório e a campo (containeres, limnocurrais, microcosmos, mesocosmos) estão sendo executados. É importante a inferência de dados experimentais corroborando dados levantados a campo diretamente no nível organizacional correspondente.
c) Miryophyllum, Hidrofitotério do Jardim Botânico, SP. d) rio Parnaíba, Floriano, PI.
Também estão sendo elaborados trabalhos testando e discutindo teorias e processos, como a teoria do distúrbio intermediário, “botton-up / top-down”, o processo de eutrofização e oligotrofização artificial, sucessão de espécies, redes tróficas e a interferência dos organismos no meio físico.
No entanto, ainda são necessários estudos básicos como a identificação, classificação e nomenclatura de organismos no Brasil. A Taxonomia, também conhecida como Sistemática, segundo Senna & Magrin (1999) é de fundamental importância para o correto conhecimento da fauna e flora associadas a determinado ecossistema aquático, portanto, ferramenta indispensável para qualquer pesquisador, permitindo levantar um conjunto organizado de informações referentes a um dado organismo ou conjunto de organismos. Como apontado por Irgang & Gastal Jr. (1996), antes de efetuar discussões aprofundadas sobre os vegetais, estendendo essa idéia a todos os organismos, deve-se determinar corretamente quais espécies são, pois sem essa informação a análise de dados posterior poderá ter reduzido valor.
Vale ressaltar que a maioria dos aspectos teóricos e modelos utilizados na ecologia foi desenvolvido na região temperada sendo necessário adaptações à realidade tropical. Outros simplesmente não são aplicados à região tropical. Dessa forma, há sim necessidade do desenvolvimento de uma “teoria própria” aos ecossistemas aquáticos continentais tropicais, como apontado por Parentoni Martins & Araújo-Lima (2001).
e) Filtros para determinação de material em suspensão. f) Barragem da represa de Jurumirim, SP.
Na atualidade, programas institucionais como o PROBIO, PRONEX, PROFIX, Pro-Doc, Instituto do Milênio, Fundos Setoriais e iniciativas de FAPs como da FAPESP, através de fundos de pesquisa como Projeto Integrado, Jovem Pesquisador, BIOTA e bolsas de formação de pós-doutorado mantém em atividade por vários anos numerosos e qualificados pesquisadores com considerável soma de recursos financeiros. O Programa Integrado de Ecologia – PIE, uma iniciativa do CNPq, visa otimizar recursos humanos e materiais para o desenvolvimento de ações concretas para a solução dos principais problemas ambientais no Brasil (Barbosa, 2001). O subprograma denominado Programa Brasileiro de Pesquisas Ecológicas de Longa Duração – PELD, constitui-se um esforço colaborativo entre cientistas e estudantes trabalhando nas diferentes regiões biogeográficas do país, compartilhando a responsabilidade de conduzir e apoiar pesquisas ecológicas nas áreas de produtividade primária / secundária, dinâmica de nutrientes, conservação da diversidade biológica, dinâmica de populações, organização de comunidades e ecossistemas, padrões e freqüência de perturbações naturais e impactos antrópicos. O Ministério do Meio Ambiente também implementou o Programa Nacional de Monitoramento Ambiental Integrado – MONITORE. Esse programa tem como objetivos: levantar informações e dados confiáveis sobre a qualidade ambiental no país e disponibilizá-los; coordenar, promover e difundir práticas e procedimentos de monitoramento ambiental; capacitar instituições para realizar trabalhos de monitoramento ambiental; desenvolver padrões metodológicos de coleta e análise de dados sobre a qualidade ambiental; desenvolver padrões estatísticos e amostrais para pesquisas significativas, em nível regional e nacional; promover o intercâmbio de informações; permitir uma análise integrada da situação ambiental no Brasil (Rizzo, 2001).
Essas iniciativas permitem estudos ambientais de envergadura possibilitando verificar padrões e testar/questionar hipóteses e teorias viabilizando a construção de modelos ajustados aos ecossistemas aquáticos tropicais, em particular ao Brasil.
g) Represa de Boa Esparança, Guadalupe, PI. h) Trabalho de campo, represa de Jurumirim, SP.
Atualmente, os estudos ambientais no Brasil têm atingido níveis de complexidade que permitem a aplicação de recorte regional com a utilização de Sistemas Geográficos de Informação (SIG) (Xavier da Silva et al., 2001; Vicens et al., 2001). Outra abordagem regional é a valoração de unidades de conservação (Obara et al., 1999; Santos et al., 2001), e estudos de percepção ambiental (Del Rio & Oliveira, 1996). Também contamos com grande variedade de material bibliográfico versando sobre diversos aspectos da ecologia, em particular nos periódicos Revista Brasileira de Biologia, Acta Limnologica Brasiliensia e Anais da Academia Brasileira de Ciências. A partir de 1997, através de iniciativa da Sociedade de Ecologia no Brasil, também vem sendo publicados artigos na Revista Brasileira de Ecologia. Também existem importantes iniciativas de livros de ecologia incorporando a experiência de pesquisadores brasileiros escritos por Salgado-Labouriau (1994), Laroca (1995) e Pinto-Coelho (2000), além dos já tradicionais Schäfer (1985) e Esteves (1988).
A Limnologia teve seu início no século XVIII com medidas de temperatura em lagos e, conseqüentemente, o reconhecimento da temperatura e densidade da água como uma das mais importantes variáveis ambientais, fundamentais na explicação do padrão de circulação das massas de água (Esteves, 1988). Relativo aos métodos empregados nos estudos limnológicos, o método Winkler utilizado na determinação do teor de oxigênio dissolvido na
O desenvolvimento da Limnologia no Brasil pode ser dividido em quatro períodos (Esteves, 1988). O período compreendido do descobrimento até 1900 foi dominado por naturalistas estrangeiros e os trabalhos constituídos em grande parte por listagens de espécies. De
i) e j) Lagoas temporárias, região do Morro dos Conventos, Araranguá, SC. k) drenagem de rejeito de mineração, Criciúma, SC.
De significativa importância para o desenvolvimento da limnologia brasileira, como apontado por Esteves (1988), foram às pesquisas coordenadas pelo Prof. Dr. José Galizia Tundisi nos Programas de Pós-graduação em Ecologia e Recursos Naturais (UFSCar) e Ciências da Engenharia Ambiental (CRHEA/USP).
Também é um marco na limnologia brasileira a publicação do livro Fundamentos de Limnologia, escrito pelo Prof. Dr. Francisco de Assis Esteves. Além de ser uma obra de referência em português, discute importantes aspectos da limnologia utilizando em profusão exemplos retirados de pesquisas desenvolvidas em região tropical, particularmente nos ecossistemas aquáticos nacionais. Além dessa publicação, há um número cada vez maior de livros discutindo aspectos relativos aos ecossistemas aquáticos nacionais (Tundisi, 1988; Bressan, 1990; Costa, 1990; Carmouze, 1994; Sipaúba-Tavares, 1994; Müller, 1995; Tundisi et al., 1995; Trindade, 1996; Agostinho & Gomes, 1997; Tundisi & Saijo, 1997; Vazzoler et al., 1997; Esteves, 1998; Henry, 1999b; Pompêo, 1999; Rebouças et al., 1999; Tundisi & Straškraba, 1999; Von Sperling, 1999; Bozelli et al., 2000; Conte & Leopoldo, 2001; Sipaúba-Tavares & Rocha, 2001; Amaral & Bittrich, 2002).
Referências bibliográficas
l) Represa de Xingo, BA. m) represa de Boa Esparança, Guadalupe, PI.