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 Fig.2: Estados alternativos em diferentes comunidades ecológicas (1 e 4), alterações ambientais que erodiam a resiliência dos sistemas (2) e o gatilho para a transição crítica. Retirado de: Folke et al., 2004.  Fig.2: Estados alternativos em diferentes comunidades ecológicas (1 e 4), alterações ambientais que erodiam a resiliência dos sistemas (2) e o gatilho para a transição crítica. Retirado de: Folke et al., 2004. 
  
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 Após revisão sistemática da literatura da área, Biggs et al. 2012 identificaram sete princípios que podem aumentar a resiliência da provisão de SE em SSEs, dos quais três estão ligados a propriedades e processos genéricos dos SSEs e quatro relacionam-se à sua governança (Fig. 3). Nesta proposta, nota-se a relevância da governança para a manutenção da resiliência dos SSEs. As autoras fazem uma distinção muito pertinente entre governança e manejo. O conceito de governança possui algumas definições; segundo as autoras, governança refere-se aos processos políticos e sociais de definição de metas para manejo; de maneira mais geral, outros autores consideram que a governança abarca instituições governamentais e também instituições informais que operam no âmbito público (Bøås, 1998 citado por Weiss, 2000) e inclui a gestão consciente das estruturas de um sistema com o objetivo de aumentar a legitimidade das ações públicas (Hyden, 1992 citado por Ruhanen et al., 2010). Um desdobramento do conceito é a governança ambiental, que pode ser entendida como o estabelecimento, afirmação ou mudança de instituições para resolver conflitos ambientais (Paavola, 2007). Já o manejo de SSEs é definido por Biggs et al. (2012) como as ações em si que são tomadas para atingir os objetivos determinados pela governança em relação ao SSE e a resiliência de seus SE, incluindo implementação e monitoramento de estratégias diversas.  Após revisão sistemática da literatura da área, Biggs et al. 2012 identificaram sete princípios que podem aumentar a resiliência da provisão de SE em SSEs, dos quais três estão ligados a propriedades e processos genéricos dos SSEs e quatro relacionam-se à sua governança (Fig. 3). Nesta proposta, nota-se a relevância da governança para a manutenção da resiliência dos SSEs. As autoras fazem uma distinção muito pertinente entre governança e manejo. O conceito de governança possui algumas definições; segundo as autoras, governança refere-se aos processos políticos e sociais de definição de metas para manejo; de maneira mais geral, outros autores consideram que a governança abarca instituições governamentais e também instituições informais que operam no âmbito público (Bøås, 1998 citado por Weiss, 2000) e inclui a gestão consciente das estruturas de um sistema com o objetivo de aumentar a legitimidade das ações públicas (Hyden, 1992 citado por Ruhanen et al., 2010). Um desdobramento do conceito é a governança ambiental, que pode ser entendida como o estabelecimento, afirmação ou mudança de instituições para resolver conflitos ambientais (Paavola, 2007). Já o manejo de SSEs é definido por Biggs et al. (2012) como as ações em si que são tomadas para atingir os objetivos determinados pela governança em relação ao SSE e a resiliência de seus SE, incluindo implementação e monitoramento de estratégias diversas. 
  
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 Fig.3: os setes princípios para resiliência de SE em SSEs. Três princípios relacionam-se a propriedades chaves do SSE para serem manejadas e quatro referem-se a atributos do sistema de governança do SSE. CAS: “complex adaptative system”, i.e, sistema complexo adaptativo. Retirado de: Biggs et al., 2012.  Fig.3: os setes princípios para resiliência de SE em SSEs. Três princípios relacionam-se a propriedades chaves do SSE para serem manejadas e quatro referem-se a atributos do sistema de governança do SSE. CAS: “complex adaptative system”, i.e, sistema complexo adaptativo. Retirado de: Biggs et al., 2012. 
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 A principal crítica do framework de análise de resiliência em SSEs e sua relação com governança é que ainda faltam explicações mecanísticas para a compreensão destes princípios, muito em razão da dificuldade em se aplicar abordagens mais tradicionais de mensuração de atributos e coleta de dados quantitativos em sistemas tão complexos como os sócio-ecológicos (Biggs et al., 2012; Sterk et al., 2017). Também é preciso desenvolver um melhor entendimento sobre como operacionalizar tais princípios em diferentes contextos de modo que seja possível avaliar como eles podem ser aplicados e melhorados. Assim, fica claro que ainda há muitas contribuições que podem ser feitas para a compreensão da resiliência em SSEs, em especial em relação aos seus sistemas de governança. Sem dúvidas, o conceito de resiliência permite olhar para sistemas complexos por uma ótica promissora, que ao abordar diretamente a incerteza e adaptação de SSEs estimulou pesquisas sobre governança (Berkes, 2017). Acredito que o conceito pode ser muito valioso para a compreensão de sistemas complexos, que englobam não apenas as comunidades puramente biológicas, mas também (e principalmente) a inter-relação entre humanos e meio ambiente.  A principal crítica do framework de análise de resiliência em SSEs e sua relação com governança é que ainda faltam explicações mecanísticas para a compreensão destes princípios, muito em razão da dificuldade em se aplicar abordagens mais tradicionais de mensuração de atributos e coleta de dados quantitativos em sistemas tão complexos como os sócio-ecológicos (Biggs et al., 2012; Sterk et al., 2017). Também é preciso desenvolver um melhor entendimento sobre como operacionalizar tais princípios em diferentes contextos de modo que seja possível avaliar como eles podem ser aplicados e melhorados. Assim, fica claro que ainda há muitas contribuições que podem ser feitas para a compreensão da resiliência em SSEs, em especial em relação aos seus sistemas de governança. Sem dúvidas, o conceito de resiliência permite olhar para sistemas complexos por uma ótica promissora, que ao abordar diretamente a incerteza e adaptação de SSEs estimulou pesquisas sobre governança (Berkes, 2017). Acredito que o conceito pode ser muito valioso para a compreensão de sistemas complexos, que englobam não apenas as comunidades puramente biológicas, mas também (e principalmente) a inter-relação entre humanos e meio ambiente. 
  
-==Referências== +== Referências ==
  
 Anderies, J.M., Walker, B.H., Kinzig, A.P., 2006. Fifteen Weddings and a Funeral: Case Studies and Resilience-based Management. E&S 11, art21. https://doi.org/10.5751/ES-01690-110121 Anderies, J.M., Walker, B.H., Kinzig, A.P., 2006. Fifteen Weddings and a Funeral: Case Studies and Resilience-based Management. E&S 11, art21. https://doi.org/10.5751/ES-01690-110121
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 +==== Processos ecológicos e transdisciplinares ====
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 +== Beatriz Moraes Murer ==
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 +A biodiversidade e a forma como essa diversidade biológica se distribui no espaço são intrigantes e há muito tempo instigam pesquisas científicas. A ecologia de comunidades é uma área de estudo que surge nessa demanda, trata-se de um campo da ciência que busca compreender padrões de diversidade, abundância e composição de espécies em comunidades, bem como seus processos subjacentes (Vellend 2010). Segundo Vellend (2010), mais de 2.300 modelos teóricos e conceituais foram desenvolvidos visando explicar tais padrões de diversidade, abundância e composição de espécies em comunidades. Apesar da grande quantidade de explicações propostas por outros pesquisadores (i.e. Tilman 1982; Hubbell 2001; outros), o autor propôs que todos os padrões de diversidade, abundância e composição de espécies nas comunidade poderiam ser explicados com base em apenas quatro processos distintos: seleção, deriva, especiação e dispersão. Para propor a visualização em processos e identificá-los, Vellend (2010) sugere uma transposição dos processos da genética de populações para a ecologia de comunidades (deriva genética, fluxo gênico, mutação e seleção natural). Dessa forma, todos os modelos, teorias e estruturas conceituais em ecologia de comunidades, como modelos de nicho (Tilman 1982), a teoria neutra (Hubbell 2001; MacArthur & Wilson 1967) e metacomunidades (Holyoak et al. 2005), poderiam também ser compreendidos com base nos quatro processos. 
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 +Enquanto os processos de dispersão e especiação estão mais relacionados à entrada de espécies nas comunidades (Ricklefs 1987; Vellend 2010), os processos de seleção e deriva estão mais associados à abundância relativa das espécies que existem na comunidade (McPeek & Gomulkiewicz 2005; Vellend 2010). A seleção é definida como uma diferença determinística de aptidão (fitness) entre indivíduos de espécies diferentes (Vellend 2010), atuando quando indivíduos em uma população variam em algum aspecto e quando diferentes variantes se reproduzem ou se replicam em taxas diferentes (Darwin 1859; Bell 2008; Nowak 2006). A utilização diferencial no uso dos recursos e as interações ecológicas, como a competição, predação e mutualismo, são exemplos da atuação do processo de seleção (Vellend & Orrock 2009). A deriva  ecológica, por sua vez, relaciona-se a mudanças aleatórias na abundância relativa das espécies. Trata-se de um processo que concebe a inexistência de diferença demográfica ou competitiva entre indivíduos de diferentes espécies (Hubbell 2001) e, portanto, que as taxas de nascimento, morte e reprodução dos indivíduos são aleatórias em uma comunidade fechada, o que caracteriza a estocasticidade demográfica (Vellend 2016). Esse processo é especialmente importante na formação de padrões em comunidades pequenas. Como consequência desses dois últimos processos - deriva e seleção -, há a extinção, que não configura um processo a parte  (Vellend 2010). Já a especiação é compreendida como a criação de novas espécies. Tal processo consiste em componente relevante para a compreensão de padrões resultantes da ação de processos históricos e geográficos sobre a dinâmica das comunidades (Ricklefs 1987; Ricklefs & Schluter 1993; Vellend 2016). Por fim, a dispersão implica no movimento de organismos através do espaço. Esse processo é responsável por conectar indivíduos entre comunidades de uma metacomunidade (Holyoak et al. 2005). A dispersão, por também influenciar variações nas abundâncias relativas das espécies, tem efeitos significativos sobre a dinâmica de comunidades ecológicas. Além disso, a composição e o tamanho das comunidades existentes influenciam diretamente a dinâmica de dispersão (Holyoak et al. 2005). 
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 +A importância da organização em processos proposta por Vellend (2010) é evidenciada, primeiramente, pelo fato de os mesmos padrões de interesse em ecologia de comunidades poderem ser gerados por diferentes processos. Sendo assim, o foco dado em padrões pode gerar conclusões errôneas, o que, por sua vez, pode trazer impactos para a comunidade - numa situação de manejo, por exemplo, concluir erros pode ser limitante para a manutenção da comunidade. Para além disso, é relevante expressar também que o mesmo processo potencialmente gera padrões distintos em diferentes circunstâncias. Ademais, muitas vezes um padrão não atua sozinho e os padrões são resultantes da interação de mais de um processo. A proposta de Vellend (2010) foi também relevante para a articulação de uma teoria geral sobre a ecologia de comunidades. Ainda, sob a perspectiva desses quatro processos, as semelhanças e diferenças entre as inúmeras abordagens conceituais e teóricas propostas anteriormente são esclarecidas, o que traz, inclusive, maior facilidade e fluidez ao campo de conhecimento e ao material didático sobre ecologia de comunidades (Vellend 2010). 
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 +Apesar de não diretamente relacionado à ecologia de comunidades, e sim à transdisciplinaridade (i.e. integração de conhecimentos acadêmicos e não-acadêmicos para resoluções de problemas do mundo real), meu mestrado pode ganhar com a organização em processos, como a feita por Vellend (2010). Meu projeto se insere no contexto em que é constatada a existência de uma lacuna entre produção de conhecimento e resolução de problemas práticos, a chamada lacuna ciência-prática (Bertuol-Garcia et al 2018). Dentre as abordagens propostas para aproximar ciência e prática, as abordagens transdisciplinares focam na integração de conhecimentos científicos e não-científicos para a resolução de problemas do mundo real e mostram-se efetivas no enfrentamento das principais causas da lacuna (Bertuol-Garcia et al. 2018). Todavia, tais abordagens exigem lidar com diversos desafios e estão dispersas em diferentes comunidades científicas (McNie 2007). Dado o potencial, mas também desafios associados a abordagens transdisciplinares, compreender melhor sobre como efetivamente implementar tais abordagens na prática é central. Assim, visando conectar visões, identificar soluções para enfrentar desafios, bem como detectar lacunas que limitam o avanço e a prática da transdisciplinaridade, busco identificar e comparar as múltiplas abordagens transdisciplinares disponíveis na literatura. Dentre os elementos relevantes que identificamos como sensíveis para subsidiar a identificação e comparação de abordagens transdisciplinares, estão exatamente os chamados processos transdisciplinares.
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 +A partir da leitura de Vellend (2010), pareceu-me relevante e enriquecedor aprofundar-me na compreensão dos processos transdisciplinares. Entretanto, definir tais processos não é elementar, considerando a multiplicidade de acepções existentes na literatura, além da confusão presente em algumas publicações que sinonimizam processos e abordagens transdisciplinares. De acordo com Lang et al. (2012), o processo transdisciplinar é conceitualizado como uma  sequência de três fases: (a) estruturação coletiva do problema e construção coletiva de um equipe de atores, (b) co-produção de soluções orientadas e conhecimento transferível através de pesquisa colaborativa, e (c) (re)integração e aplicação do conhecimento produzido tanto na prática científica quanto na social. Para Scholz & Steiner (2015), “processos transdisciplinares relacionam pesquisa interdisciplinar com conhecimento de vários atores”. Já Seidl & Le (2012) expressam que os processos transdisciplinares são caracterizados por liderança conjunta, representação da comunidade científica e legitimada por tomadores de decisão tendo papéis equitativos. Aqui processos transdisciplinares são definidos como aquilo que precisa ser feito para atingir a resolução de problemas do mundo real através de integração entre conhecimentos acadêmicos e não acadêmicos. Avaliando abordagens elencadas em meu projeto, identifiquei dois processos transdisciplinares gerais: colaboração entre atores (stakeholders collaboration) e aprendizagem mútua (mutual learning). Colaboração entre atores implica na identificação dos atores relacionados ao problema e engajamento entre eles. Esforços colaborativos entre pesquisadores e outros atores não acadêmicos trazem a promessa do aumento de legitimidade, apropriação e responsabilização pelo problema, bem como para com as soluções (Gibbons et al. 1994; Baumgärtner et al. 2008). Já a aprendizagem mútua, emerge como a geração de novas ideias, relações disciplinares redefinidas e estruturas integradas construídas (Klein 2008). Esse processo perpassa a construção de consenso sobre as transformações necessárias para alcançar soluções (Vilsmaier et al. 2015). É definido como o processo de troca, geração e integração de conhecimento em diferentes setores da ciência e da sociedade (Scholz 2000). Por meio da aprendizagem mútua, “o conhecimento de todos os participantes é aprimorado, incluindo o conhecimento local, o conhecimento científico e o conhecimento de indústrias, negócios e organizações não-governamentais (ONGs)” (Häberli et al. 2001). O processo deveria permitir combinar ideias científicas com o conhecimento adquirido em contextos não científicos para garantir um alto grau de validade e confiabilidade dos resultados, por um lado, e aplicabilidade e relevância, por outro (Vilsmaier et al. 2015). Acessando as abordagens transdisciplinares na literatura, essas ideias vêm presentes também separadamente em três termos, que, se agrupados, representam a mesma essência de aprendizagem mútua: “knowledge production”, “knowledge exchange” e “knowledge integration”. A troca, produção e integração de conhecimento implicam que conhecimentos estruturados de forma diferente devem ser discutidos e integrados, gerando, assim, novos conhecimentos. As diferentes formas de conhecimento representam importante subsídio para a solução de problemas. Esse processo concebe que todo conhecimento prático, cotidiano e acadêmico (nas diversas disciplinas) deve ser integrado, a fim de encontrar soluções para problemas práticos e criar novos conhecimentos que transcendam fronteiras disciplinares (Goodeman 2008). Dessa forma, por tamanha semelhança, esses três processos foram compreendidos como englobados em aprendizagem mútua. Por fim, consta manifestar que eu não soube enquadrar convictamente alguns elementos de extrema relevância à transdisciplinaridade, como a identificação do(s) problema(s), as estratégias para sua resolução e a produção de conhecimento robusto. Cheguei a refletir se se tratam de processos, e autores como Jasmin Godemann (2008) me convenceram à priori que não se sustentam enquanto tal, mas configuram inputs e outputs dos processos. Porém, assumo não estar convicta disso. 
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 +É relevante expressar que os processos identificados estão presentes em toda abordagem transdisciplinar, ainda que com especificidades singulares de cada abordagem. A forma particular de conduzir cada um dos processos, através de técnicas, mecanismos e instruções particulares, objetivando a resolução de problemas do mundo real e assumindo a relevância e necessidade da integração entre conhecimentos acadêmicos e não acadêmicos para aproximar a ciência da prática, é o que define uma ou outra abordagem transdisciplinar. A diferença central entre processo e abordagem transdisciplinar reside no fato dos processos indicarem o que fazer e as abordagens expressarem o como fazer para atingir tal objetivo. As especificidades de cada processo são parte central da caracterização de cada uma das abordagens transdisciplinares. A Figura 1 explora um mesmo processo visualizado em quatro diferentes maneiras de conduzi-lo (i.e. abordagens). O item a, por exemplo, traz a forma de condução do processo em abordagens como a co-research (“co-pesquisa”), onde há interação direta entre cientistas e tomadores de decisão, e o item c traz a representação do processo presente em abordagens como a chamada usable science (“ciência usável”), que requer de maneira específica, a atuação de um mediador de conhecimento. Diferente dos processos de Vellend (2010), que são independentes, os processos transdisciplinares são interdependentes. Apesar de os processos ecológicos serem passíveis de coexistência e o resultado de um impactar na ocorrência de outro processo, a existência de um não depende da existência de outro. Isso se dá pois, por exemplo, ainda que a absoluta ausência de seleção seja teórica, para que ocorra deriva não há necessidade que haja seleção - e assim por diante. No caso dos processos transdisciplinares, essa afirmação não se sustenta nem mesmo teoricamente. Não há, em transdisciplinaridade, aprendizagem mútua sem troca, produção e integração de conhecimento, que por sua vez, só ocorre a partir do engajamento dos atores, sem o qual não há resolução de problemas reais. Os processos transdisciplinares identificados estão, portanto, interconectados em uma cascata sequencial. 
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 +Figura 1. Diagrama conceitual delineando 4 maneiras de aumentar a integração de conhecimento entre os atores (adaptado de Cvitanovic et al., 2015).
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 +Assim, considerando que a atenção dada aos processos ecológicos reverberou positivamente na melhor compreensão dos padrões de diversidade, abundância e composição de espécies em comunidades, propus que dar atenção aos processos transdisciplinares poderia iluminar a compreensão sobre as abordagens transdisciplinares. O esforço de refletir sobre os processos transdisciplinares, buscando defini-los, identificá-los e, inclusive, compreender sua diferença com relação às abordagens transdisciplinares foi muito enriquecedor para meu projeto. Muitas vezes, tomamos entendimentos como consolidados e refletir e ter de redigir a respeito deles, nos enriquece, por permitir e demandar mais pesquisas, reflexões e reformulações. Foi o que me aconteceu nesse caso. Entendo que ainda há necessidade de mais aprofundamento e afinamento com relação à definição e identificação desses processos transdisciplinares. Assumo que potencialmente haja mais processos não identificados por mim, ou ainda, que haja imprecisão nos processos que propus aqui. Todavia, o esforço aqui expresso representa um relevante primeiro e grande passo dado à compreensão desses processos, essencial para maior compreensão das abordagens transdisciplinares - objeto de meu estudo.
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 +== Referências Bibliográficas ==
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 +Baumgärtner, S., Becker, C., Frank, K., Müller, B., & Quaas, M. (2008). Relating the philosophy and practice of ecological economics: The role of concepts, models, and case studies in inter-and transdisciplinary sustainability research. Ecological Economics, 67(3), 384-393.
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 +Bell G. 2008. Selection: The Mechanism of Evolution. Oxford (UK): Oxford University Press.
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 +Bertuol‐Garcia, D., Morsello, C., N. El‐Hani, C., & Pardini, R. (2018). A conceptual framework for understanding the perspectives on the causes of the science–practice gap in ecology and conservation. Biological Reviews, 93(2), 1032-1055.
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 +Cvitanovic, C., Hobday, A. J., van Kerkhoff, L., Wilson, S. K., Dobbs, K., & Marshall, N. A. (2015). Improving knowledge exchange among scientists and decision-makers to facilitate the adaptive governance of marine resources: a review of knowledge and research needs. Ocean & Coastal Management, 112, 25-35.
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 +Darwin C. 1859. On the Origin of Species by Means of Natural Selection, or the Preservation of Favoured Races in the Struggle for Life. London (UK): John Murray.
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 +Gibbons, M. (Ed.). (1994). The new production of knowledge: The dynamics of science and research in contemporary societies. Sage.
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 +Godemann, J. (2008). Knowledge integration: A key challenge for transdisciplinary cooperation. Environmental Education Research, 14(6), 625-641.
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 +Holyoak M., Leibold M. A., Holt R. D. 2005. Metacommunities: Spatial Dynamics and Ecological Communities. Chicago (IL): University of Chicago Press.
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 +Hubbell S. P. 2001. The Unified Neutral Theory of Biogeography and Biodiversity. Princeton (NJ): Princeton University Press.
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 +Klein, J. T. (2008). Evaluation of interdisciplinary and transdisciplinary research: a literature review. American journal of preventive medicine, 35(2), S116-S123.
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 +Lang, D. J., Wiek, A., Bergmann, M., Stauffacher, M., Martens, P., Moll, P., ... & Thomas, C. J. (2012). Transdisciplinary research in sustainability science: practice, principles, and challenges. Sustainability science, 7(1), 25-43.
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 +MacArthur R. H., Wilson E. O. 1967. The Theory of Island Biogeography. Princeton (NJ): Princeton University Press.
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 +McPeek, M. A., & Gomulkiewicz, R. (2005). Assembling and depleting species richness in metacommunities. Metacommunities: spatial dynamics and ecological communities. The University of Chicago Press, Chicago, 355-373.
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 +McNie, E. C. (2007). Reconciling the supply of scientific information with user demands: an analysis of the problem and review of the literature. Environmental science & policy, 10(1), 17-38.
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 +Nowak M. A. 2006. Evolutionary Dynamics: Exploring the Equations of Life. Cambridge (MA): Belknap Press of Harvard University Press.
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 +Ricklefs R. E. 1987. Community diversity: relative roles of local and regional processes. Science 235(4785):167–171.
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 +Ricklefs R. E., Schluter D. 1993. Species Diversity in Ecological Communities: Historical and Geographical Perspectives. Chicago (IL): University of Chicago Press.
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 +Scholz RW (2000) Mutual learning as a basic principle of transdisciplinarity. In: Scholz RW, Häberli R, Bill A, Welti W (eds) Transdisciplinarity: joint problem-solving among science, technology and society. Workbook II: mutual learning sessions. Haffmans Sachbuch, Zürich, pp 13–17
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 +Scholz, R. W., & Steiner, G. (2015). The real type and ideal type of transdisciplinary processes: part I—theoretical foundations. Sustainability Science, 10(4), 527-544.
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 +Seidl, R., & Le, Q. B. (2012). Modelling human-environment systems in transdisciplinary processes.
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 +Tilman, D. (1982). Resource competition and community structure. Princeton university press.
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 +Vellend, M. (2010). Conceptual synthesis in community ecology. The Quarterly review of biology, 85(2), 183-206.
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 +Vellend M., Orrock J. L. 2009. Genetic and ecological models of diversity: lessons across disciplines. Pages 439 –461 in The Theory of Island Biogeography Revisited, edited by J. B. Losos and R. E. Ricklefs. Princeton (NJ): Princeton University Press.
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 +Vellend, M. (2016). The theory of ecological communities (MPB-57). Princeton University Press.
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 +Vilsmaier, U., Engbers, M., Luthardt, P., Maas-Deipenbrock, R. M., Wunderlich, S., & Scholz, R. W. (2015). Case-based mutual learning sessions: knowledge integration and transfer in transdisciplinary processes. Sustainability science, 10(4), 563-580.
  
ensaios/2020/start.1610417690.txt.gz · Última modificação: 2021/01/12 02:14 por paulo
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